Se você está trabalhando com TI ou ao menos atuando no mundo corporativo assim como eu, certamente você já deve ter ouvido falar em Transformação Digital. Toda semana os principais sites de negócios comentam que a empresa X está fazendo sua transformação digital com a consultoria Y. Ou que a empresa W avança em sua transformação digital através da estratégia de implantar os processos ABC e a solução XPTO.
Mas será que é isso que significa fazer uma transformação digital? Implantar um ERP de mercado? Mudar para processos mais ágeis? Contratar uma consultoria boutique?
Afinal o que é uma transformação digital? O que é uma empresa digital?
Pensando em auxiliar quem está tentando descobrir as respostas para estas perguntas, no artigo de hoje trago algumas definições, estudos de mercado e experiências próprias, com o mínimo de achismo possível e o máximo de fatos e conceitos consolidados. Eu não inventei estas teorias e vários trechos eu li em outros lugares, sendo que informarei os links originais ou citarei o autor sempre que possível.
O que é Transformação Digital?
Esse é um termo que está cada vez mais famoso no Brasil, certo?
Mesmo por aqui, Transformações Digitais estão eclodindo em todas grandes empresas que não querem ficar de fora da profusão de matérias sobre o tema e da atenção dos investidores. No entanto, ser digital está longe de apenas informatizar processos manuais e trocar tecnologias, exige um redesenho da organização e uma evolução de sua cultura, dois elementos muito mais delicados.
A questão é que transformações de negócios, de qualquer tipo, são extremamente custosas e arriscadas. Para um negócio se tornar digital, não basta adicionar uma camada de tecnologia ou executar o desenvolvimento de software, você tem de inserir a mesma nas entranhas das camadas já existentes. Não é algo que você resolve investido no departamento de TI da empresa, mas distribuindo a TI por toda a empresa. Ou então o contrário, distribuindo business por toda TI. Não importa.
Não ajudei muito até aqui, certo? Calma, vai melhorar.
Muitas corporações estão se deparando com a necessidade de uma transformação digital, mesmo sem saber direito o que é uma.
De acordo com uma pesquisa de 2017 da CEB chamada “The New IT Operating Model for Digital”, dois-terços dos líderes de negócios acreditam que suas empresas vão perder competitividade se eles não se tornarem significativamente mais digitais. Eles entendem que a sobrevivência de suas empresas depende da sua habilidade de se adaptar a esse novo modelo da economia digital.
Mas o que é ser digital?
A versão online do dicionário Merriam-Webster oferece várias definições para o vocábulo “digital” e duas delas tem a ver com as transformações que estão acontecendo: “dados na forma de dígitos binários” e “interação tátil com os dedos”.
Tecnicamente, quando falamos de transformação digital expandimos esses dois conceitos básicos para mais quatro (segundo Phillipe Assouline, da InfoQ):
- Experiência do Cliente (CX)
- Cybersegurança
- Automação
- Mídias Sociais
Sendo assim, uma empresa digital é, por essas verticais, aquela que:
- possui sistemas digitais;
- sistemas estes de interação fácil e intuitiva (pra não ficarmos preso ao tátil);
- cujos clientes (internos e externos) possuem uma boa experiência;
- se preocupa com segurança cibernética;
- possui processos automatizados;
- entende e se comunica com seus clientes através de plataformas sociais;
Uma empresa que deseja se tornar digital deve considerar esses seis verticais de prioridades na hora de compor a sua “estratégia digital”. Estratégia essa que pode ser mais ou menos agressiva, mais ou menos intensa, mais inclinada para um vertical e menos para outro, mas sem negligenciar qualquer um deles.
Estratégia de Transformação Digital
No seu famoso Digital Transformation Guide, Assouline menciona que toda empresa passando por uma transformação digital está em um de três estágios: Going, Becoming ou Being Digital e que a jornada de transformação é justamente ir do primeiro estágio ao terceiro.
O autor entende que absolutamente TODAS empresas estão aptas a saírem da inércia e chegarem aos estágios um e dois, sendo que o dois é a famosa Transformação Digital que tanto se fala, onde sistemas, processos, comunicação, experiência do cliente e segurança são aperfeiçoados.
E aí que mora uma falha comum na definição da estratégia digital, ou melhor, na falta de UMA!
Ao invés de planejar como sairemos da inércia para um plano de transformação digital (estágio um, Going Digital) é comum vermos executivos mudando sistemas e implantando novos processos por toda empresa, sem entender o que se está buscando com cada mudança e como elas se conversam entre si, causando um caos completo e banalizando o termo “digital” como algo hipster que está na moda mas que não traz valor algum, coisa de empresa que gasta dinheiro para parecer cool.
O autor afirma que uma empresa digital está mais relacionada à conectividade da empresa com o mercado e a sua capacidade de entregar valor de maneira rápida e barata na ponta do que a adoção de novas tecnologias por si só.
Entender o nível desejado de união entre negócios + tecnologia que se quer alcançar é a chave para planejar, mapear e comunicar a intenção da organização com a transformação digital que se deseja iniciar. Para isso, Assouline, que é Head de Data Science e Market Insights em uma grande consultoria, criou um modelo de planejamento, representado na imagem abaixo, que ele chama de DTF: Digital Transformation Framework.
Por este framework, temos que a base de toda transformação digital deva ser a segurança cibernética (de comunicação e relação automática com os seres humanos), sustentando três pilares.
O primeiro pilar, Tema Digital, é fortemente baseado na definição do que é ser digital que comentei lá em cima, desdobrados em seis temas que fazem sentido para uma empresa fictícia. Enquanto que User Experience, Automation e Social Media são transcrições literais dos verticais abordados anteriormente (além da própria fundação de cybersecurity), Cryptography, Cloud Computing e IoT são demandas específicas da transformação digital de exemplo.
O autor não menciona isso explicitamente, mas menciona de leve que qualquer um dos temas devem ser substituídos pela sua estratégia de transformação, usando os verticais originais como base e as tendências atuais de mercado. Também é interessante notar que uma transformação pode ser faseada, e diferentes temas ou os mesmos temas com intensidades diferentes podem ser abordados em cada fase, como na metodologia Toyota Kata.
Só para citar como exemplo, no Agibank, onde trabalhei de 2017 a 2019 como Agile Coach, os temas da transformação digital eram 4: Infraestrutura Híbrida, Cybersegurança, Business Agility e Arquitetura Corporativa. Obviamente eu trabalhava focado no tema #3 e apenas apoiava o #2 e #4.
O segundo pilar, Orientação ao Cliente, te ajuda a definir se a estratégia é focada no cliente externo ou interno. Este framework assume que a estratégia digital pode ser composta por várias sub-estratégias, ou seja, podemos ter alguns temas que serão dedicados ao cliente externo em uma estratégia e outros temas ao cliente interno, por exemplo.
O terceiro pilar, Nível de Competência, cruza com os Temas Digitais, onde define-se qual o nível de competência a empresa irá buscar em cada um dos temas definidos para sua transformação digital, considerando três possíveis níveis: Competitivo, Indústria e Mínimo.
- o nível Competitivo demonstra que a empresa deseja ser referência no tema específico e para isso investirá tempo e dinheiro acima da média do mercado; será um diferencial competitivo;
- o nível Indústria demonstra que a empresa deseja atender aos padrões de mercado, às expectativas comuns para este tema em sua área de atuação; deseja se equiparar aos seus competidores;
- por fim, o nível Mínimo demonstra que a empresa deseja apenas alcançar o mínimo de competência, entendendo que estará abaixo de seus concorrentes neste tema, mas que não o deixará desassistido;
Seguindo esta explicação do framework e continuando com o exemplo de transformação anterior, podemos plotar o segundo resultado usando o DTF, como uma proposta de transformação digital (totalmente hipotética, baseado nas necessidades e situação de um cliente fictício).
Neste exemplo do DTF preenchido temos uma estratégia composta por duas sub-estratégias, conforme explicação a seguir.
A estratégia 1 (verde claro) é de investir pesado em automação de processos para clientes externos (finais), tornando-se extremamente competitivo neste campo, acima de seus competidores, enquanto que a UX destes mesmos clientes externos deva atender às exigências do seu mercado, equiparando com seus concorrentes.
Já a estratégia 2 (amarelo) é de atender às exigências médias de mídias sociais para sua área de atuação com os clientes externos (talvez esta empresa não se comunicava com os clientes por redes sociais) e oferecer o mínimo de infraestrutura em nuvem para os clientes internos (talvez alguns ambientes para os time de tecnologia).
Essas duas estratégias não abrem mão de segurança digital, não sendo uma opção investir ou não nesse tema.
No próximo artigo, vou explorar como desdobrar esta estratégia em ação na sua empresa, ainda usando o framework DTF de Phillipe Assoulini.
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Olá, tudo bem?
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